Não sei quando e nem como, fui me apaixonar. Logo eu que estava cansada e protegida por um sistema que não me deixava envolver por ninguém, nenhum cara, nada de amor. O problema de criar regras é perceber que o destino faz o que quiser, por isso, estar preparada é sempre a melhor alternativa.
Escrevo nesse diário antigo, a história da minha vida em quinze dias. Duas semanas que mudaram completamente o rumo da trajetória pensada para mim.
Era verão de 2011, mais precisamente, janeiro. Meu pai que há anos não morava mais comigo e mamãe, me ligou pedindo que fosse passar uma semana na casa onde ele agora morava. O motivo de tal proposta era simples, mas irrecusável: a “minha querida” madrasta tinha ido viajar para cuidar da filha que estava em trabalho de parto. Aceitei não apenas por saber que meu pai necessitava de alguém para ele conseguir manter-se vivo durantes aqueles dias, mas também por aproveitar e matar a saudade incontrolável que sentia.
O difícil foi avisar minha mãe. Para ela, ver meu pai é quase tão pecador como ofender uma mosca. Defensora dos animais, Dona Marina não é uma mulher fácil. Às vezes penso que meu pai saiu de casa por não conseguir entender seu jeito intenso, até mesmo exagerado, de ver as coisas. Embora conhecesse mais do que ninguém esses defeitos que ela mantém, sou a pessoa que mais ama aquela mulher em todo mundo. Por amar tanto assim, decidi ser direta e falar logo, para acabar de vez com essa tarefa nada fácil. Afinal, achar desagradável minha atitude, ela acharia de qualquer jeito.
- Mãe, porque você está limpando tanto esse tapete? – perguntei curiosa.
- Seu tio Roby vai me trazer o Forte. – respondeu quase me ignorando.
- Forte? – questionei.
- O poodle que ele ganhou em uma rifa. Vou cuidar dele já que seu tio não tem consideração alguma por animais – gritou furiosa com a atitude do irmão mais velho.
Essa não era a hora certa para pedir algo tão importante, mas conclui que esperar não iria adiantar nada.
- É, mãe, eu po-posso passar duas semanas em São José com papai? – gaguejei
Ela parou tudo que estava fazendo e me olhou seriamente. Por mais que ela odiasse a ideia, ela não podia me impedir de visitar meu pai. Então, ela apenas disse:
- Por favor, apenas duas semanas.
A viagem para casa do meu pai foi como sempre, assustadora. Talvez o receio que sempre tive em andar de avião me fazia imaginar que não chegaria, nem por um golpe de sorte, em um local onde tivesse que ir sem me sentir segura, em terra firme. São José, Costa Rica era meu destino. Sair do Rio Grande do Sul para ir até lá, precisava de no mínimo muita coragem, pelo menos para mim.
Meu pai desde que se separou de minha mãe tinha conseguido mais dinheiro do que eu imaginava. Sua vida, regada de luxos, não tinha comparação à vida simples que nos levávamos no sul do Brasil. Ele e Verônica, a mulher pela qual ele abandonou nossa família, abriram um negócio de exportação de produtos eletrônicos. O destino fez com que os dois tivessem sorte na capital de Costa Rica e lá ficaram até hoje.
Cheguei ao Aeroporto Internacional Juan Santamaría às quatorze horas e não encontrava meu pai. Já eram dezesseis horas e nada. Comecei a ficar nervosa, o celular que serviu para escutar músicas e mais músicas durante a viagem, a fim de fazer com que esquecesse que estava a mais de 10 mil metros da terra, terminou a bateria me deixando incomunicável. Só me restava esperar.
Sempre odiei esperar. Será que era tão difícil chegar na hora? Estava cansada, com sono e ainda um pouco enjoada devido ao nervosismo que fiquei. Foi quando, de repente, avistei o Chevrolet Camaro de meu pai vindo em direção ao banco desconfortável no qual estava sentada. Irritada, levantei e sem olhar direito para o interior do carro, ajeitei minha bolsa que enganchou no espelho. Enquanto tentava sair daquela situação, aproveitei para ir tirando satisfações com papai, como uma boa e fiel escorpiana que perde paciência muito fácil.
- Sabia que estou com fome, sede, sono e prestes a estourar de dor de cabeça. É assim que tu me retribuis por te amar tanto? – gritei
- Olha, na verdade eu não sabia que você me amava, mas sabe que não é uma má ideia. – uma voz grossa e irônica me respondeu.
Olhei para dentro do carro e percebi que não era meu pai na direção, nem no banco de trás, nem em lugar algum. A única pessoa no carro, a dona daquela voz irritante, estava agora rindo de mim. Poderia ter perguntado logo quem era, mas estava tão impulsiva que só consegui gritar:
- Cadê meu pai? Ele sabe que estou esperando aqui há mais de duas horas? Fala logo!
O riso debochado e ao mesmo tempo sarcástico daquele brutamonte que se encontrava no carro do meu pai, dirigindo o Camaro tão amado por ele, conseguiu me fazer parar de gritar e apenas virar as costas.
- O que houve garotinha? Calma, entre no carro que te explico tudo – ele falou pausadamente.
- Garotinha? Tu não sabes nada sobre mim! Não tem direito de tirar conclusões.
- Realmente, seu pai estava certo. Você é mais difícil do que aparenta.
- Então você e meu pai andam falando de mim? Já sei. Você é um espião? Um segurança idiota que vai tentar me controlar? Nossa, meu pai me surpreende.
- Calma aí garotinha – falou em meio a risos – Sou apenas o motorista do Dr. Gustavo.
- Eu já disse pra não me chamar de garotinha, tenho dezessete anos. Posso não ser tão velha como você, mas estou longe de ser considerada uma menina. – falei duvidando de mim mesma.
Podia ter dezessete anos, porém, tinha tremido por andar de avião, ficado sem paciência por ter que esperar e ainda quase chorado de raiva por não saber o que se passava na cabeça do meu pai em me deixar, abandonada, naquele aeroporto. Atitudes de criança. Eu tinha consciência disso, mas aquele idiota não tinha o direito de ficar brincando com alguém que ele mal conhecia.
- Vinte e oito. Apenas vinte e oito – ele disse
- O que? Tu estás doido?
- Tenho vinte e oito anos, sou novo. Você me chama de velho para poder dizer que ter dezessete anos é como ser uma adulta responsável.
- Tu és ridículo!
- E você fica linda falando “tu”.
Aquilo foi o máximo que meu estresse poderia aguentar. Dei de costas e saí caminhando rapidamente para qualquer lugar, desde que fosse longe daquele, daquele! Não tinha palavras pra demonstrar o quanto ele me irritou.
- Ei, espere aí! – falou enquanto eu sentia passos atrás de mim.
Ele me segurou pelo braço e gritou:
- Vim aqui te buscar, estou tentando levar você para casa e é assim que age comigo? Venha, entre no carro que seu pai precisa falar contigo quando chegarmos em casa.
- Ta, mas larga meu braço.
- Tudo bem, mas depois não reclama quando te chamar de criança novamente.
- Ah, eu te ..
- Amo. Já sei. Você já me disse isso. Aliás, foi bem rápido. Não acha que apressou as coisas?
- Engraçadinho – sussurrei sem vontade.
- Vamos lá lindinha, agradeça a Deus por eu existir.
Entrei no carro e fiquei em silêncio até que ele rompeu a quietude estabelecida por mim.
- A propósito, sou Bill.
- Marília, respondi friamente.
Chegamos à casa do meu pai e eu fui logo perguntando:
- Por que o senhor não foi me buscar? Ou melhor, porque mandou aquele idiota?
- Também senti saudades querida. Bill é meu motorista e é um cara responsável e competente.
- Acho que o senhor não sabe o empregado que tem!
- Eu disse que estava com saudades filha.
- Desculpe, eu também estou com saudades, muitas saudades. Mas é que fiquei muito irritada, perdão.
Meu pai sempre foi assim, amoroso e sério ao mesmo tempo. Carregamos minhas coisas para dentro do quarto onde iria ficar.
Passei a noite toda pensando naquele estúpido, projeto de humorista, irritante e idiota. O que eu tinha de errado? Não deveria lembrar nem mais o nome de um guri assim. Ai, guri! Se ele ouvisse garanto que iria gozar do meu sotaque gaúcho. Idiota, idiota. Não conseguia imaginar outra definição melhor e assim adormeci.
Fui acordada por Judite, empregada na casa. Ela me disse que eu deveria levantar rápido e fazer as malas. Perguntei o que tinha acontecido:
- Seu pai teve que ir para Sidnei. A filha da Dona Verônica ganhou gêmeos e como o marido dela é de uma família que gosta de comemorar todos os presentes que a vida os oferece, vão fazer uma comemoração por essa graça enviada.
- Sidnei, Sidnei? Sidnei na Austrália?
- Sim, Marília.
- Espera aí. Meu pai saiu no meio da noite para ir à outro continente, logo no dia que cheguei aqui? E nem me avisa? Não posso acreditar.
- Querida, ele já deixou tudo preparado. Você vai agora meio dia com o monomotor particular dele. Arrume-se e vá. Não dê motivos para ele ficar triste, por favor, ele te ama.
- Está bem, mas e minha mãe? Ela nunca vai permitir.
- É aí que você se engana Marília. Seu pai ligou para sua mãe, explicou a situação e ela permitiu. Com um pouco de custo, é claro, mas conseguiu.
A primeira coisa que me veio à cabeça foi “onde minha mãe está com a cabeça em me deixar ir justamente para onde não quero?”. E a segunda foi: “Forte. É claro. O cãozinho deve estar fazendo ela muito feliz, só pode”.
Peguei minha mala sem ainda conseguir acreditar no que iria fazer. Viajar para a Austrália. Já achava longe Costa Rica, me dava dor no estômago apenas em pensar. Mas pensei no que Judite tinha dito. Ela estava certa, eu não podia ser má com meu pai. Se para ele era importante, pra mim também teria que ser.
Depois de tudo pronto, peguei a mala e fui até onde Judite me orientou que o jato estaria. Não queria admitir, mas tremia como de costume, apenas ao pensar em sair da terra firme.
Cheguei ao jato e não queria acreditar no que via. Não, não seria possível. Bill estava lá, sentado onde algum piloto de verdade estaria, vestindo uma roupa preta, óculos escuros e usando aqueles enormes fones. O barulho do avião já ecoava, portanto, ele precisava gritar para que eu conseguisse escutar.
Mas como se manter calma quando alguém que mesmo falando calmamente te irrita, sorri como se te ver fosse a coisa mais divertida do dia e perceber que justamente essa pessoa, será a responsável por uma das missões mais difíceis. Voar era algo tenebroso, ainda mais voar com Bill. Não, não, eu deveria estar sonhando, relutando contra o pesadelo. Não pode ser verdade, por favor, meu Deus.
- E aí garotinha? Pronta para voar?
- Não, quer dizer, sim. Mas nunca com você.
- Tudo bem, você pode pegar a barca e ir remando. Então, a gente se encontra lá.
- Para. Eu não tenho problema nenhum com aviões, eu só não quero voar com você. Ainda mais sozinha.
- Olha meu amor, juro que vou me comportar. Agora, entre aqui! O céu está ficando nublado, vamos passar o oceano antes que fique mais escuro ainda.
- Não vou!
- Estamos sem tempo, lindinha. Entre logo e não reclame.
Entrei naquele monomotor sem nem olhar para o rosto de Bill. Não queria ir, de maneira alguma, com ele, mas infelizmente não tinha escolha. Bendita hora em que minha mãe resolveu me deixar viajar para outro continente. Essa realmente não era minha viagem dos sonhos. Viajar para Austrália para presenciar meu pai comemorando o nascimento dos “netos” gêmeos, filhos de uma garota que jamais o amaria como eu amo, não era um passeio legal. E ir até lá, com o cara que me tira do sério se sentindo o piloto mais perfeito do mundo, definitivamente, não era o melhor meio para viajar.
- Coloque o cinto e o fone mocinha, vamos voar!
Aquela expressão fez gelar meu coração. O medo que sentia era maior do que qualquer outro. Não queria atravessar o oceano com Bill. Como iria saber se ele era ou não, um bom piloto? Como saberia se esse monomotor conseguiria atravessar o pacífico? Deus que nos ajudasse.
- Marília?
- O que?
- Ei, você está tensa. Melhore este rosto, sou piloto profissional. Trabalhei na Aeronáutica Brasileira durante cinco anos.
- Está explicado o porquê de falar tão bem português – respondi.
- Minha mãe é brasileira, fiquei com ela no Brasil até conseguir esse emprego com seu pai. Pode parecer simples o que faço, mas consigo mais dinheiro aqui.
Fiquei em silêncio, sem saber ao certo o que falar. Por que ele resolveu me contar sobre sua vida? Eu não precisava saber nada disso, só queria chegar logo.
- Eu amo aquela mulher. Pena que não mantemos mais contato.
Não quis perguntar o motivo, mesmo que estivesse louca de curiosidade. Então, ele agora tinha se tornado emotivo e sensível, que boa hora para ficar com pena dele.
O silêncio que se estabeleceu entre a gente depois disso, não durou muito tempo. O monomotor começou a fazer um barulho estranho, enfraquecendo-se devagar.
- O que houve? – gritei
- Estamos caindo!
- E tu falas assim, como se fosse algo simples! Estamos no meio do pacífico, Bill!
- Eu sei Marília, vou tentar pousar – falou calmamente.
- Pousar? Tu estas louco? Por acaso quer que uma pista apareça no meio do mar?
- Olha para lá, está vendo aquele ponto?
- Onde? – perguntei irritada
- Alí, preste atenção.
Ele puxou minha mão e apontou para baixo.
- Aquele ponto. É ali que vamos pousar, fique calma, acabou o combustível, é só isso.
Comecei a chorar, era só isso que poderia fazer em um momento desses. Estava chocada! Sempre odiei aviões, helicópteros e agora odiava ainda mais aquele monomotor. Sem falar no Bill, ele parecia tão tranquilo. Isso era impossível em uma situação daquelas. A calma dele me fazia o tolerar ainda menos.
O avião começou a aumentar a velocidade. Agora sim sabia que tudo era verdade. Bill pousou sobre aquela ilha à qual, minutos antes, ele chamava de ponto.
O pouso forçado fez com que o avião se balançasse em um ritmo assustador. Fechei os olhos e quando percebi minha mão sendo apertada firmemente por outra grande e forte. Quem ele pensava que era? Já não chega ter me convencido a entrar nessa coisa chamada monomotor, agora tinha a audácia de tocar em mim. Mas o medo foi mais forte que meu orgulho, me fazendo apertar ainda mais sua mão com a vontade de ao fechar os olhos voar para o sul do Brasil e dar um abraço em minha mãe.
Pousamos. O avião bateu contra uma árvore, amortecendo a rapidez da queda. Bati minha cabeça e vi Bill soltando se da poltrona e segurando meu rosto. Foi a última lembrança que tenho antes de acordar, quarenta e oito horas depois da queda.
Abri meus olhos e a primeira coisa que enxerguei foi o sol. Ele brilhava forte e o calor era grande. Olhei para o lado e avistei um lago, um coqueiro e muita areia. Estava confusa e não sabia o que pensar. Foi quando o vi.
Bill estava sem camisa, sentado em uma pedra e selecionando folhas em uma pilha que se encontrava aos seus pés. Observando comecei a lembrar de tudo. Não acreditava em tudo que minha memória me passava.
- Bill, porque ainda estamos aqui? Quero ir embora, porque tu me esperaste dormir para depois pensarmos em um modo de sair daqui?
- Talvez por não ter uma solução para isso acontecer – afirmou.
- Como assim, podemos fazer o avião voar de novo.
- Você está louca? Olhe para trás.
Virei e percebi o estado que a queda deixou o monomotor. Não teria condições, realmente, de fazê-lo ir aos céus novamente.
- E celular? Vamos ligar – questionei
- O meu acabou a bateria e o seu está sem sinal.
- Então tu andaste olhando meu celular, não é mesmo? Só basta eu dormir por alguns minutos que já se apropria das coisas alheias.
- Foram dois dias.
- O que?
- Você dormiu por dois dias. Coma algo, deve estar faminta.
Ainda perplexa, pensei em como pude dormir por tanto tempo. Ao observar a minha volta percebi que foi tempo suficiente para Bill montar uma cabana com folhas de bananeira, pescar alguns peixes e ainda cuidar a hora que eu acordaria. Isso tudo não parecia ser verdade. Tinha muito mais jeito de filme ou história fictícia de um livro. Mas não, estava mesmo acontecendo comigo, e o pior de tudo: tinha Bill no meio disso.
Por algum motivo intenso e sem explicação certa, eu o odiava. Odiava tanto Bill que me senti falsa em ficar agradecida por tudo que ele estava fazendo. Só que isso, ele jamais ficaria sabendo.
- Garotinha, vem cá me ajudar com essas folhas.
- Vou fingir não ter ouvido isso – retruquei.
Assim passaram-se dez dias. Há doze estávamos lá, apesar de não lembrar nada dos dois primeiros. Minha relação com Bill se baseava em ódio e compaixão. Na maioria das vezes me via discutindo e discordando de tudo que aquele homem dizia. Mas isso era inútil. Se eu, escorpiana, me achava teimosa, ele deveria ser escorpião, com ascendente no mesmo signo. Como pode alguém ser minha versão exageradamente mais irritante?
Bill conseguia me provocar de uma maneira absurda. Ele irritava pelo simples fato de respirar. Se eu tentasse pegar um coco no alto do coqueiro e não conseguisse, ele não era capaz de me ajudar, sem antes dar várias gargalhadas. Ao tomar banho era a mesma coisa. Ele ria ao dizer que estava vendo tudo ou que iria se apressar para entrar no lago também. Por falar em lago, agradeço por ele existir. Bill avisou que a ilha onde pousamos se chama Tofua, é deserta, vulcânica e se localiza no meio do Pacífico.
Os dias passavam devagar. Ficar em uma ilha deserta, sem meio de comunicação, com a pessoa mais irritante, não era nada legal. Por isso tentávamos de tudo. Pensamos em construir um barco, mas tínhamos noção de que só uma grande e segura barca seria capaz de atravessar metade do Pacífico.
Foi por isso que começamos, aos poucos, tentar entender. Só restava esperar alguém nos achar. Estávamos sobrevivendo bem. Tofua é uma ilha tropical, com frutas e embora seja vulcânica, não há tantos riscos assim. O único problema em ficar lá, era aguentar Bill e suas graçinhas.
Certo dia ele me parou após um banho no lago e disse que eu deveria ser mais normal. Não poderia ficar me escondendo dele já que tínhamos um relacionamento.
- É para rir, não é mesmo? – respondi
- Claro que não! Entramos juntos nisso aqui, temos que ficar unidos. E eu vejo o quanto você me olha durante o dia, fingindo não saber sobre meu olhar atento na situação. Admite vai, fala logo o quanto está apaixonada e enlouquecidamente encantada por mim.
- Tu és maluco.
- Sim, sou maluco, doido e como você sempre fala, idiota. Porque só um idiota seria capaz de amar a garota mais insuportável da face da Terra.
- Cala a boca – gritei
- Eu digo que estou apaixonado por ti e você me manda calar a boca? Você é surda?
Sai correndo para a beirada do oceano, com vontade de ir nadando até o Brasil. Mas como, ainda, estou com a cabeça no lugar, não fiz isso. Foi quando senti alguém me segurar pela cintura. O peso do corpo dele me fez cair sobre a areia. Ele segurava meus braços, enquanto eu relutava contra. E então, me percebi entrelaçada pelo corpo dele, sentindo-me presa em um sentimento que se dividia em amor e ódio. Aquele clichê da ideia ”entre tapas e beijos”.
Então, depois de nos encararmos diante da situação que nos encontrava, ele aproximou o rosto, segurou meu queixo e me xingou.
- Sua boba! Quem diria que estaríamos aqui, juntos e sem rumo?
- Não sei, só quero ir embora e me livrar de vez de ti.
- Tem certeza? – me calou com um beijo.
Beijar o homem que eu odiava não era algo normal. A explosão de sentimentos me invadiu por inteira. Fiquei com raiva de mim mesma por sentir o que senti.
Foram três dias de amor. Quando se completou 15 dias que estávamos lá, percebemos que o ódio por alguém, é sim uma emoção apaixonada. Se desde o início apenas ignorasse ele, seria porque ele não tinha importância alguma. Mas o fato de ele mexer comigo, me provocar, despertou em mim a última emoção que poderia imaginar em sentir: o amor.
Era difícil admitir isso, mas estávamos, aparentemente, apaixonados.
No mesmo dia, ao final da tarde, avistamos um grande barco vindo em nossa direção. Rezamos para que nos visse e pudéssemos voltar para um local que não seja um circulo de terra e mato, no meio do oceano.
A embarcação parou na costa da ilha e juntos corremos felizes em busca de socorro. “Deve ser meu pai”, pensei. Ao chegar perto, não vimos o que esperávamos. Dois caras encapuzados, com armas estavam no lugar onde deveria existir minha família, preocupados com nós e feliz por nos encontrar.
Bill apenas gritou: Corre! E eu corri para trás de uma planta. Minha mãe sempre dizia que quando me sentisse em perigo pensaria muito neles. É verdade! Eles foram o meu principal pensamento naquela hora. Meus pais são tudo para mim e vou amá-los para todo o sempre.
Meu piloto desastrado e ser humano hiperativo, tinha acabado de me fazer apaixonar e não seria agora que alguém estragaria essa alegria.
Enquanto Bill brigava com os homens mascarados, encontrei uma taboa que iria ajudar. Treinei uma vez no tronco de uma árvore e fui direto ao alvo. Bati com força na cabeça do bandido, que desmaiou inconsciente.
Fiquei com pena do desgraçado até que lembrei que estava disposta a vencer a situação e começar uma nova vida. Uma vida com Bill. Então, depois, com toda força que pude, bati no outro, que desabou no chão.
Estávamos livres. Livres para viver um grande amor. Embarcamos no barco que nossos “queridos amigos” bandidos deixaram de presente e estávamos prontos para partir, até que o mais estranho, para duas pessoas capazes de se matar a três dias atrás, acontece. Bill olha para mim e diz:
- Marília, eu te amo.
- Graças a Deus! Afinal, estou cansada de ser tratada como criança.
- Sim, eu te entendo, garotinha.
- Que bom que tu sabes pirralho!
Rimos juntos sobre tudo. Agora, me sentia uma nova mulher. Decidida, forte e impulsiva. Então é isso, querido diário. A história da minha vida em 15 dias se deu da forma mais inesperada que existe: apaixonando-me pelo pior cara do mundo e prestes a atravessar o Pacífico ao lado dele.
Conto feito por mim, para a disciplina de Leitura e Produção de Textos II -
2º Semestre de Jornalismo